Um dia me peguei observando um grupo de 100 crianças brincando em um grande campo. Elas corriam, chutavam bolas, pulavam cordas, se escondiam, gritavam, mexiam seus pequenos corpinhos com seus sorrisos no rosto.
Quando eu era criança, não me identificava com os outros da minha idade e tinha a tendência de achar todos eles idiotas. Fui uma criança parada, silenciosa, envergonhada, reprimida e, por isso, julgadora. Enquanto observava aqueles montes de criancinhas, meu primeiro pensamento foi o mesmo da minha infância: que idiotas, pra que ficar correndo e gritando? E meu segundo pensamento, pela primeira vez, tentou buscar essa resposta.
Como não tinha outra coisa a fazer senão isso, fiquei ali sentada observando de longe. Adultos dão vários motivos pra necessidade das crianças brincarem; o desenvolvimento da coordenação motora, da força muscular, de habilidades espaciais, de relações sociais, construção de identidade, imaginação, isso entre as que pensei agora. Mas, pras crianças, nada disso interessa, elas não possuem esses motivos. Por quê, então?
Se não pensam em fazer amizades, se não pensam em desenvolver seus corpos, mentes e emoções, pra que ficar fazendo coisas aparentemente tão sem sentido? Então me veio a resposta: pra gerar felicidade. Não há outro motivo pra brincadeira senão o de gerar felicidade, acender algo dentro de si que vai agir como uma energia, um impulso que traz sensações boas.
Perceber isso me entristeceu e me fez pensar. Me deu vontade de sair correndo e começar a ir atrás das criancinhas, gritando junto a elas, compartilhando seus brinquedos e brincadeiras, mas algo me impediu. Um pouco de preguiça, de frustração, de culpa, de vergonha, de incapacidade também, não sei exatamente. Além da tristeza, a pergunta: o que eu faço exclusivamente com a intenção de ser feliz? O que eu faço que me acende algo dentro do peito, que me faz ter vontade de viver, de agir no mundo, que me dá a força física de levantar o corpo e exercer o que quer que seja?
Me percebi em um ciclo vicioso. Não tenho energia, então não consigo realizar coisas pra mim; não consigo realizar coisas pra mim, então não tenho energia, porque é isso que gera a vontade de viver. As coisas sem sentido são as que dão força de vontade pra exercer as tarefas necessárias da vida, as coisas sem sentido que colocam a felicidade de conseguir viver. A realização da criatividade pela criatividade, do movimento físico pelo movimento, da espontaneidade apenas pela expressão, sem a intenção de mostrar pros outros, de produzir uma obra, de se exercitar, é o que nos faz ser felizes. E me entristeceu perceber que não faço isso.
Pensei sobre todas as coisas que eu gosto; de tocar instrumentos, mas tenho vergonha mesmo de ensaiar pra mim mesmo porque me comparo aos outros, me considero ruim, penso que tenho que poder mostrar isso pra alguém com propriedade e assim perco a espontaneidade e não tenho a energia necessária pra fazer. Escrever, mas na hora que tenho as ideias não paro de fazer o que estou fazendo pra colocar elas no papel e quando decido fazer isso, acaba sendo um compromisso conseguir escrever e, além disso, escrever algo de valor estético e poético, e assim travo e não acontece. De me movimentar, mas tenho vergonha dos meus movimentos e julgamentos que posso receber sobre eles, mesmo que saiba que na verdade a única pessoa que está julgando sou eu mesma, além da preguiça e falta de energia pra mover mais do que alguns dedos pra escrever essas palavras. De observar paisagens e meditar, mas o tempo é tão curto e tenho tantas coisas a fazer que isso acaba sendo um desperdício dos míseros poucos minutos que me dedicaria nessa atenção.
Consigo identificar algumas coisas que me deixam feliz com esse único objetivo, mas acabam sendo ilusórias porque não passa de um engano. Posso me embebedar, fumar maconha, fazer uso de qualquer substância que sei que vai me trazer bons momentos de diversão e felicidade, mas não é o suficiente pra gerar essa chama no peito que dá vontade de viver.
To procurando. Mas o pior dessa procura é encontrar, mas não conseguir exercer e prosseguir sentindo vazio, triste e frustrado com a vida, que é tão linda.
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