Tive que me obrigar a perder parte da minha inocência pra ser capaz de viver nesse mundo, e, mesmo assim, não foi suficiente. A parte que sobrou duvida que algumas coisas são realidade, e, quando percebe que é verdade, já não há mais tempo pra reagir. Enquanto isso, o outro lado vive sua vida normal de homem que arranja desculpas e se vitimiza pra justificar um assédio, e é legitimado pela falta do constrangimento que não fui capaz de proporcionar.
Um dia inteiro me oferecendo cerveja, me chamando de longe pra encher meu copo, falando comigo em inglês e cantando músicas românticas. Na inocência, pensei ser só a ação de um velho bêbado sendo de seu próprio tempo, e justamente é esse o problema: ele era exatamente isso, um velho bêbado do seu próprio tempo, o que foi justificativa suficiente pra que, na primeira oportunidade, se grudasse nas minhas costas enquanto eu lavava um copo na pia.
Pediu desculpas, não me leva a mal, achei que tu fosse ela, e aponta pra outra mulher próxima, como se nela ele pudesse fazer o que havia feito; provavelmente nem a conhecia. A minha resposta foi só um qual é que é meu, respondida por um não me leva a mal não, e pronto: mais um homem que vai continuar sendo exatamente como é.
É tão difícil isso de ser responsável até pelo assédio que recebo, pensando que pra mudar algo, pra isso não acontecer de novo, sou eu que preciso reagir, eu que preciso fazer algo. Eu que preciso ser responsável por dizer de alguma forma, seja branda ou bruta, pro velho homem branco que ele agiu mal. É quem sofre que fica a cargo, primeiramente, de ensinar o assediador, já não bastasse todo o peso de ser assediado. E, assim, acaba não mudando muita coisa, por já ser gasto demais de energia ter sofrido isso até pra poder reagir no momento. É mais fácil deixar assim mesmo e não se preocupar, pra não se incomodar com a resposta justificadora e sem razão do outro.
Mas não quero que seja assim. Quero, primeiramente, não passar por isso de novo, mas, caso aconteça, não ser inocente o suficiente pra pensar à primeira vista que foi sem querer, e, à segunda vista, pra não ter palavras de repulsa pra expor o ato. Quem não tem razão é que tá vencendo na sociedade. É um peso ter razão e ser tomado como louco, mas peso maior ainda, pra todas, é ter que ficar em silêncio.
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